Desde que a Chaos Magick teve sua grande apoteose no cenário brasileiro, o número de adeptos e simpatizantes vem crescendo de maneira assustadora. Um dos principais motivos que encoraja os magistas a se aventurarem no movimento é a premissa escrita no Livro da Lei de Aleistar Crowley, que grande parte dos chaoistas usam para embasar seus argumentos e defender suas práticas. A máxima "Nada é verdadeiro, tudo é permitido" se tornou uma resposta comum aos questionamentos acerca de práticas ritualísticas dentro da Chaos Magick. Não é raro entrar no Facebook ou em qualquer outra rede social e ver um magista defendendo práticas absurdas ou pretensiosas citando as palavras de Crowley numa tentativa de justificar sua conduta como magista e de transformar seus atos, por consequência, em ações inquestionáveis. Com o tempo e a ascensão da Chaos Magick, os magistas se deixaram cristalizar com essa resposta e passaram a deixar o questionamento e a compreensão dos paradigmas de lado, para se alienarem num jogo de faz de conta mágico onde o que eles ditam é a lei.
O estudo antropológico, histórico e mitológico que poderia ser usados para guiar a interpretação de arquetipos e signos foi substituido por tabelas de associação com informações rasas, facilmente encontradas na internet e todo o conceito de semiótica e o estudo da psiquê que poderia ser contemplado para um maior entendimento de estados alterados de consciencia, desmisficação da gnose e uma eficácia maior nos trabalhos mágicos foi deixado de lado por uma concepção de efeito placebo dentro da bruxaria. O Livro da Lei passou a ser usado como desculpa e escudo por adeptos que negligenciavam a importância acadêmica para o caminho da magia e o conceito primordial de paradigmas foi distorcido e se tornou obsoleto. Em suma, a Chaos Magick é um meta-sistema que utiliza de outros sistemas mágicos ou religiosos como ferramenta para se obter um resultado. Ao se utilizar de um sistema, é necessario entender os paradigmas (ou seja, as leis e os dogmas) que o compreende e aceitar o paradigmas como forma de alcançar o resultado através da concórdia com a egrégora ou o sistema que se está sendo trabalhado. O processo de uso de um sistema através de seus preceitos se dá através da fé e da vontade do magista para com os princípios do sistema a ser trabalhado Um exemplo bem didático pode ser elaborado com base numa suposição simples, como um adepto ao sistema cristão que pede a Deus por uma cura. O adepto parte do pressuposto de que: 1) Deus existe; 2) Deus tem o poder de curar; 3) Deus ouve as orações daqueles que o clamam; 4) Deus faz aquilo que lhe pedem através das orações.
Ao negligenciar qualquer um desses paradigmas, rompe-se a estrutura na qual o sistema foi construído e corta-se a linha tênue que permite o adepto entrar em comunhão com o mesmo. O adepto é rejeitado pelo sistema por não obedecer ao seu código e a magia deixa de ser funcional. O que acontece é uma presunção por parte do magista de tentar moldar o sistema ou a egrégora a obedecê-lo de forma que a mesma se ajuste à sua zona de conforto e ao seu pouco conhecimento mágico. Experimente se atirar de um prédio de 15 andares. A gravidade é um dos paradigmas calculados na física - Sistema ao qual estamos todos sujeitos. Tentar subverter essa lei específica não o tornará imune à queda. O sistema irá rejeitar a sua tentativa de desconstrui-lo e você será subjulgado pela sua prepotência. Os paradigmas dentro dos sistemas que estão estabelecidos devem ser respeitados As palavras de Crowley são erroneamente associadas a uma falsa concepção de um dos conceitos básicos dentro do Caoismo, que se refere ao abandono de um sistema (e por consequência suas leis) para então se utilizar de outro outro sistema específico. A Quebra de Paradigma é um conceito que deve ser aplicado no microcosmo individual do adepto e que está intimamente ligado a concepções do superego para com o ego e de uma quebra ideologica no inconsciente que ecoe até o consciente ou ao plano material. O abandono de uma crença por outra, ou a mudança no campo imaginário no que diz respeito a idealogias filosóficas ou comportamentais de um individuo acarretam numa quebra de paradigma no universo dessa pessoa, e aí então o livro da lei se torna uma justificativa plausível a ser usada.
Há uma demanda urgente numa mudança de conceitos no âmbito mágico. Ou estarremos fadados a engolir uma geração de bruxos frustrados, megalomaníacos e alienados com suas práticas levianas.